Papo sério, guloseimas e afins.

Sorte do dia:
"Ah se eu pudesse sacar meu revólver" (Madre Teresa de Calcuta)

“Não há nada que uma boa paulada na nuca não resolva” (Mahatma Gandhi)

“But we can, you kow we can Let´s lynch the landlord man!!!” (DEAD KENNEDYS)

“Take’em all, take’em all Put’em up against a wall and shoot’em Short and tall, watch’em fall Come on boys take’em all!!!” (COCK SPARRER)

07/12/2010

Estados Unidos e Wikileaks: a democracia fugiu de controle?

Artigo de Izaias Almada, retirado do Escrevinnhador: www.rodrigovianna.com.br

Um curioso artigo do jornalista espanhol Pascual Serrano publicado em “El Periódico de Catalunya” e reproduzido no site www.rebelion.org levanta uma questão interessante provocada pelos milhares de telegramas vazados pelo site Wikileaks na internet, mas que – de algum modo até intrigante – ultrapassa a polêmica criada na imprensa mundial diante do volume e do conteúdo ali exibidos.

Diz Serrano na introdução do seu texto que o fenômeno Wikileaks tem monopolizado numerosas análises e reflexões sobre o futuro da informação, da internet e da própria difusão de notícias. É natural. Como o direito à informação e à liberdade de imprensa se constituem em pilares, entre outros, da democracia tal qual a conhecemos e é praticada em boa parte do mundo ocidental, chama a atenção o fato de que parece se configurar com maior nitidez uma verdade que a hipocrisia de muitos ‘democratas’ procura esconder e maquiar há algum tempo: afinal existem informações e… informações. Como também existem concepções diferentes sobre a liberdade de imprensa.

Quando um país, como os Estados Unidos da América, apóia um golpe de estado contra um governo democraticamente eleito, o último exemplo é a deposição do presidente Manuel Zelaya em Honduras (mas a lista é imensa só nos últimos 50 anos), é justo encobrir ou negar essa informação? Em nome de quê? De quem? E a liberdade de imprensa onde é que fica? Os chamados segredos de estado só pesam em um dos pratos da balança?
 
  
Não é por acaso que o pensador e lingüista Noam Chomsky declara, a propósito dos recentes vazamentos no Wikileaks, que os governantes norte americanos tem profundo desprezo pela democracia, essa mesma da qual se orgulham e querem impor ao mundo através da força.

Muito a propósito, vejamos as recentes declarações do atual embaixador dos EUA no Brasil, Thomas Shannon, em artigo escrito para o jornal Folha de São Paulo no dia 2 de dezembro passado: “O presidente Obama e a secretária de Estado Hillary Clinton decidiram dar prioridade à revigoração das relações dos EUA no mundo. Ambos têm trabalhado com afinco para fortalecer as parcerias existentes e construir novas parcerias no enfrentamento de desafios comuns, das mudanças climáticas e da eliminação da ameaça das armas nucleares até a luta contra doenças e contra a pobreza.

Obedecendo à orientação de Washington para minimizar os telegramas wikis, o blá, blá, blá retórico de Thomas Shannon é vazio de significado prático e recheado de conteúdo cínico. No contexto da América Latina, quais seriam esses desafios, senhor embaixador? O combate ao narcotráfico, por exemplo? Mas qual é o maior país consumidor de drogas pesadas no mundo e, portanto, grande sustentáculo do narcotráfico internacional, segundo relatórios da ONU? Os Estados Unidos da América. Qual o volume de dinheiro do narcotráfico branqueado em bancos norte americanos? Em termos mundiais, já ultrapassa a casa dos 400 bilhões de dólares por ano.

Quanto às mudanças climáticas, é sabido que até a presente data o país do Sr. Shannon ainda não assinou o Protocolo de Kyoto, criado em 1997 com o objetivo de reduzir a produção de gases poluentes, sendo os EUA o país que mais polui o meio ambiente mundial. Dispenso-me de comentar sobre o cinismo da “eliminação da ameaça de armas nucleares”. Repito aqui apenas a velha e surrada pergunta: por quê os EUA não dão o exemplo e começam a destruir o seu próprio arsenal nuclear? Sobre a luta contra a doença e a pobreza, o Sr. Shannon deveria olhar para dentro de seu próprio país e ver os estragos causados no sistema de saúde privatizado, tão bem avaliado pelo cineasta Michael Moore; ou avaliar o atual nível de desemprego e pensar nos imensos guetos de miséria espalhados pelo país, sobretudo entre afros descendentes e hispânicos.

 
O ainda referido artigo publicado na FSP é uma catilinária de parvoíces, eivada de frases vazias, mas sempre com aquela pontinha de arrogância com a qual os “nossos irmãos do norte” se acostumaram a tratar o mundo. Prestem atenção nessa simples e emblemática frase do embaixador norte americano no Brasil sobre os telegramas do Wikileaks, eivada de arrogância e ‘espírito democrático’: “Uma ação cuja intenção é provocar os poderosos pode, em vez disso, pôr em risco aqueles que não têm poder.” Ou seja: nós, os poderosos (leia-se EUA), se provocados, podemos pôr em risco os que não tem poder (o resto do mundo).

Mas é exatamente isso o que seu país já faz, senhor embaixador, com ou sem o Wikileaks. Como é que ficam os assassinatos de civis no Afeganistão e no Iraque? Quantos idosos, mulheres e crianças já morreram para receber (custa-me mais uma vez engolir o cinismo) a velha e empoeirada democracia de Abraham Lincoln? O que significa enviar dez mil soldados armados até os dentes para uma ajuda humanitária ao Haiti?
Volto agora ao jornalista Pascual Serrano. Sobre o debate entre defensores e críticos para saber se o site de Julian Assange comete uma irresponsabilidade com a e circulação de informação secreta, o jornalista espanhol considera que há uma simplificação do tema e que o modus operandi do próprio Wikileaks vem demonstrando que o assunto é mais complexo.

Serrano, sem mostrar duvidas quanto à veracidade dos tais telegramas, levanta a enigmática hipótese de se saber a razão pela qual, de início, o Wikileaks ofereceu de forma privilegiada e com exclusividade 250.000 documentos a cinco grandes meios de comunicação mundial, The New York Times, The Guardian, Der Spiegel, Le Monde e El País. Tais órgãos de informação divulgaram em seguida que tinham “autonomia para decidir sobre a seleção, valoração e publicação das informações que afetassem a seus países (EUA, Grã Bretanha, Alemanha, França e Espanha).

Portanto, e ainda segundo Serrano, a conivência entre o Wikileaks e o cartel criado entre esses cinco órgãos de comunicação, é absoluta. E conclui: “Não sei se a origem do site Wikileaks era limpa e honesta. O que parece claro, contudo, é que está se convertendo num objeto domesticado, a ponto de o primeiro ministro de Israel Benjamim Netanyahu afirmar que os documentos dão razão ao seu governo ao valorizar a ameaça iraniana”.

 
Os vazamentos Wikileaks significariam o simples desnudamento da diplomacia de intimidação e espionagem colocadas em prática por Washington, tornando explícito para o mundo aquilo que muitos já sabiam ou desconfiavam? Criam constrangimentos para o complexo industrial/militar e as grandes corporações capitalistas ou, ao contrário, significam uma nova e sofisticadíssima forma de contra-informação digna de um filme de Hollywood?

O atual líder republicano no senado norte americano, Mitch McConnell, declarou em entrevista para a rede de televisão NBC que Assange é “um terrorista de alta tecnologia”. O dano causado aos EUA é enorme e, segundo o senador, Assange deve ser julgado com todo o peso da lei. Se por acaso isso causar problemas legais, “muda-se a lei”, completou McConnell. Parece que desde a eleição de Bush filho, quando se fraudou a lei no estado da Flórida para sua eleição, ou mesmo bem antes, quando John Kennedy foi assassinado, a democracia norte americana vem mudando algumas de suas leis a fim de se manter como sendo a democracia exemplar para o resto do mundo.

Ainda é cedo para maiores projeções nessa ou naquela direção sobre os telegramas wikis ou sobre o papel representado por Julian Assange. Uma coisa é certa. A pergunta que se configura aos poucos e que o confronto entre a força avassaladora da nova informação eletrônica e a da velha mídia mundial a serviço do poder hegemônico do capitalismo nos coloca é a seguinte: a democracia representativa burguesa está fugindo ao controle de quem a tutela?

Izaías Almada é escritor, dramaturgo, autor – entre outros – do livro “Teatro de Arena: uma estética de resistência” (Boitempo) e “Venezuela povo e Forças Armadas” (Caros Amigos).

 

06/12/2010

Rio de Janeiro: quem ganha com a guerra?

O Rio de Janeiro acaba de passar por mais um triste e violento episódio de violência urbana. As favelas do Complexo do Alemão, da Vila Cruzeiro e seu entorno acabam de ser reconquistadas pelo Estado fluminense. Matando algumas dezenas de pessoas (todas taxadas como criminosos perigosos), desrespeitando direitos humanos e constituicionais e impondo um regime de medo sobre a população local, a operação foi considerada um sucesso pela mídia e grande parte da população que assisitu a tudo pela TV.

Os mesmos alvos de sempre

É sempre bom ressaltar o que afirmou Nancy Cardia, do Núcleo de Estudos de Violência da USP : “Você não espera que o Estado não domine áreas de uma capital de Estado que já foi capital da República! Tanque da Marinha, helicóptero da Aeronáutica, tropas do exército para ajudar uma polícia a recuperar o Estado, para mim indicam que alguma coisa fracassou!"

Agora que a poeira assentou (ou seja, dá para ligar a TV e ver outra coisa passando), A CORTIÇA também gostaria enfia seus dedos gordos nas feridas abertas.

BRINCANDO DE MOCINHO E BANDIDAGEM

Para um breve histórico desse recente "combate à violência no Rio de Janeiro", vale a leitura do artigo de Bruno Lima Rocha, "A Ação Bélica no Estado do Rio de Janeiro" (basta clicar no link).

Não é a primeira vez que as Forças Armadas atuam de forma tão espetacularizada sobre o Rio.  Entre novembro de 1994 e maio de 1995, no fim do Governo Brizola (PDT) e início do Governo Marcello Alencar (PSDB), ocorreu a "OPERAÇÃO RIO", na qual inúmeras favelas foram ocupadas pelas Forças Armadas, policiais militares e civis do Rio de Janeiro, com a justificativa de acabar com a violência e o narcotráfico no Estado... Será que funcionou? E agora, no que será que vai dar?


Já era um fato conhecido que seria necessário transformar o Rio em um Estado policial por conta da Copa do Mundo de 2014 e das Olimpíadas de 2016. O mesmo já foi feito para os Jogos Pan-Americanos de 2007, na cidade de Rio de Janeiro. Não se lembra? Então acesse esse link do Centro de Mídia Independente sobre o Pan-2007, refresque sua memória e, sim, fique muito assustado de ver o que nos aguarda!


Portanto, que Estado iria tratar o cidadão (sobretudo o pobre) como "supeito" já era conhecido. A surpresa talvez seja o fato de ter acontecido agora,  ainda em 2010, passado apenas um mês das eleições presidenciais. O que será que aconteceu?

É muito diíficil acreditar na versão que vai para a imprensa sobre a origem dos ataques no Rio. Foi apresentado ao Brasil que alguns dententos do Penitenciária Federal de Segurança Máxima de Catanduvas, no oeste do Paraná (uma das quatros penitenciárias federais construídas para receber os criminosos  considerados como mais perigosos do país), em pleno contato com traficantes Comando Vermelho (CV), aliados a setores da Amigo dos Amigos (ADA), insatisfeitos pela perda de territórios às Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs), conseguiram dar ordens para que se iniciasse uma série de ataques na cidade do Rio de Janeiro. 

Mesmo Luiz Eduardo Soares, ex-Secretário Nacional de Segurança Pública, conhecido do grande público por ser um dos co-autores dos livros "Elite da Tropa" e "Elite da Tropa vol2" (isso mesmo, os que geraram os dois filmes "Tropa de Elite"), rejeita essa versão dos fatos. Em entrevista concedida ao programa Roda Viva (de 29 de novembro), da TV Cultura, contesta essa motivação dos ataques e faz outras explicações extremamente esclarecedoras sobre a violência urbana do Rio de Janeiro. Veja abaixo


E foi isso! Do domingo de 21 de novembro até a quarta-feira de 1º de dezembro,  um total 105 veículos foram incendiados. Além disso, cabines da PM atacadas e uma viatura da Aeronáutica metralhada. Bom, "era a brecha que o sistema queria. Avisa o IML, a mídia, avisa todo mundo: chegou o grande dia". Então, tendo como como motivação os ataques, começaramos preparativos para os eventos esportivos de 2014 e 2016.

MAS QUEM LUCRA COM ESSA GUERRA?

O modelo de tráfico estabelecido no Rio de Janeiro está e franco declínio. Já não funciona mais da mesma forma e nem consegue manter a estabilidade econômica de outros tempos. Perde espaço para as milícias (que atuam em áreas muito além do narco-tráfico). 

Para Luiz Eduardo Soares: “o modelo do tráfico armado, sustentado em domínio territorial, é atrasado, pesado, anti-econômico: custa muito caro manter um exército, recrutar neófitos, armá-los (nada disso é necessário às milícias, posto que seus membros são policiais), mantê-los unidos e disciplinados, enfrentando revezes de todo tipo e ataques por todos os lados, vendo-se forçados a dividir ganhos com a banda podre da polícia (que atua nas milícias) e, eventualmente, com os líderes e aliados da facção. 

"Bem amigos da Rede Globo, falamos ao vivo diretamente do reality-show da Vila Cruzeiro, 
onde tem gente fuzilada, pé na porta de barraco e tudo para agradar a você da zona sul carioca"

É excessivamente custoso impor-se sobre um território e uma população, sobretudo na medida que os jovens mais vulneráveis ao recrutamento comecem a vislumbrar e encontrar alternativas. Não só o velho modelo é caro, como pode ser substituído com vantagens por outro muito mais rentável e menos arriscado, adotado nos países democráticos mais avançados: a venda por delivery ou em dinâmica varejista nômade, clandestina, discreta, desarmada e pacífica. Em outras palavras, é melhor, mais fácil e lucrativo praticar o negócio das drogas ilícitas como se fosse contrabando ou pirataria do que fazer a guerra. Convenhamos, também é muito menos danoso para a sociedade, por óbvio.”

Então, se há guerra, é porque há alguns setores da sociedade que tiram muito proveito dela. Acima de todos o Estado e a mídia corporativa. E ambos unidos para favorecer as elites (que, claro, controlam ambos).

Nos principais canais de TV (Globo, Record, SBT, enfim esses aí) as ações policiais eram transmitiadas ao vivo. Em tempo real, você poderia ver repórteres com coletes à prova de bala participando das incursões militares e policiais sobre o a Vila Cruzeiro e o Complexo do Alemão. Os repórteres corriam junto com os policiais, deitavam e rolavam no chão quando ouviam tiros, corriam atrás dos tanques da marinha, etc, esptáculo, etc, espetáculo! Violência na TV (sobretudo no bairro dos outros) é sempre um bom programa de domingo!


As revistas semanais (Veja, Época, IstoÉ) unificaram seus discursos e suas capas (exceção honrosa à Carta Capital que, em vez do espetáculo, preferiu falar sobre a saída de Henrique Meirelles do Banco Central... você sabe, um evento aí sem qualquer importância!).

A mídia FDP ... ou seja, falta de pauta

Não apenas unificaram suas capas, mas também o seu conteúdo extremamente paupérrimo, apresentando uma versão dos fatos onde, no Rio de Janeiro, está em curso uma guerra do bem contra o mal. Para Luiz Eduardo Soares: "a polaridade [polícias versus tráfico] esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la -- isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia -- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias."

Nessa linha de raciocínio, questionando a polariadade, Leandro Uchoas, do Brasil de Fato, faz uma excelente análise do confronto carioca no artigo "Guerra do Bem Contra o Mal?" (clique e leia). 

Em meio a tantas informações, sempre vem à memória o excelente documentário de Kátia Lund e João Moreira Salles: Notícias de Uma Guerra Particular (2005). Dá um panorâma muito amplo da guerra que ocorre no Rio de Janeiro relacionada com o tráfico de drogas. O destaque é para a entrevista do ex-chefe da Polícia Civil do Rio de Janeiro, Hélio Luz (bombástica)! Se ainda não viu, clique no nome abaixo e se prepare!


E, no momento em que a mídia corporativa investe nessa imagem das Forças Armadas e das polícias invadindo favelas, estourando casas, prendendo e matando, sabemos muito bem qual é o esteriótipo de bandido que os telespectadores e os assinantes da Veja querem ver mortos: preto, pobre, fodido!

OS DERROTADOS DE SEMPRE

Novamente recorrendo aos textos e às entrevistas de Luiz Eduardo Soares, ao tratar sobre a coexistência entre corrupção e abuso de autoridade na política, ele afirma: "É sistêmico! As instituições policiais estão produzindo essa brutalidade endêmica que é indissociável com a corrupção. No Rio de Janeiro, de 2003 a 2009, inclusive, foram mortas 7.854 pessoas por ações policiais. Mais de mil por ano. Nas pesquisas realizadas, mais de 65% caracterizam-se como execuções extra-judiciais. Esses números são escandalosos. São recordes mundiais. Num ambiente desse tipo [corrupto] quantas foram investigadas? Quem é que morre? É o negro, pobre jovem, que vive nessas áreas! Sempre! Será que isso é um caso individual? É um padrão institucionalizado que se reproduz"
 Há 500 anos, o mesmo estereótipo do marginal padrão 
larga e fartamente reproduzido na mentalidade nacional
Conforme afirmou na entrevista concedida à Carta Capital, Rubens Casara, Conselheiro e Coordenador do Núcleo do Rio de Janeiro da Associação Juízes para a Democracia (AJD), vê as reclamações de abuso policial com preocupação e afirma que demonstram uma crise de legalidade. Casara defende que a violação de preceitos da constituição pela polícia é incompatível com o regime democrático. "Agir dessa maneira significa duas opções:ou rasgamos a Constituição, ou acabamos com a hipocrisia e admitimos que a democracia não é para todos". Leia essa entrevista excelente neste link.

Ou seja, colocar as Forças Armadas contra a população assim como ocorreu na Ditadura Militar não tem nenhum problema para uma parcela considerável da sociedade, afinal, a vítima agora é o preto, pobre, fodido, morando na favela, esperando para aparecer na TV como "mais um maldito traficante morto"!
Em 2001, a psicóloga Cecília Coimbra, uma das fundadoras do grupo Tortura Nunca Mais e coordenadora da Comissão Nacional de Direitos Humanos do Conselho Federal de Psicologia, publicou um estudo chamado "Operação Rio – o mito das classe perigosas: um estudo sobre a violência urbana, a mídia impressa e os discursos de segurança pública" (Editora Oficina do Autor e Intertexto de Niterói). 
A pesquisadora analisa a intervenção do Exército no Rio de Janeiro, entre janeiro de 1994 e maio de 1995, e desarma uma série de mentiras da mídia corporativa. O primeiro deles é o de que a ocupação pelas Forças Armadas dos locais ditos perigosos acabaria com a violência urbana. E o que acontece na prática, segundo a autora, é que essa ocupação se volta contra a população pobre! Aos poucos a mídia vai preparando o espírito da população e abrindo o caminho para a intervenção das Forças Armadas, sobretudo em áreas carentes, o que aconteceria em novembro de 1994. Em janeiro desse mesmo ano, os jornais apresentavam como chamada de primeira página "Empresários querem Exército nos morros". Estava em curso a Operação Rio. E com o esquema já em andamento os jornais informavam com títulos como "Exército Comanda a Operação contra o crime", "Nova Fase da Operação vai corrigir erros" e assim sucessivamente. 
Fuzileiros Navais e policiais do BOPE invadindo o Complexo do Alemão
Por conta disso, a política de segurança atua contra a população pobre! Até o dia 02 de dezembro, a Corregedoria da Polícia Militar do Rio de Janeiro já havia recebido 27 denúncias por parte de moradores da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão acusando os prejuízos provocados por policiais nas operações. Eletrodomésticos destruídos, desaparecimento de bens, roubo de dinheiro, invasão de domicílios e outras condutas consideradas ilegais ou abusivas pelos moradores foram, inclusive, noticiadas pela mídia.
Ocupação militar na rua dos outros (sobretudo porque os "outros" são pobres), ao vivo na TV, é refresco para muitos! Dos 51 mortos registrados desde o início dos ataques, quantos foram execuções sumárias?

DEFENDENDO A CAUSA PERDIDA

E não dá para encerrar o assunto antes de lembrar do seguinte: das cerca de 42 toneladas de drogas apreendidas na ocupação militar no Complexo do Alemão, cerca de 38 toneladas eram apenas de maconha. O resto era LSD, cocaína, lança-perfume, etc.

Se fosse legalizada, haveria essa guerra?

Quer dizer então que quase a totalidade do poder dos traficantes do Complexo do Alemão provinha da venda de maconha? Quer dizer então que se a maconha fosse legalizada todos esses "inimigos públicos" não teriam mais como ter poder de fogo?

Fato: o consumo da maconha não é tão danoso, ao indivíduo e a sociedade, quanto os efeitos do consumo do cigarro e do álcool!

Partindo desse pressuposto simples e lógico, sempre que você ver na TV (ou sentir na pele) problemas relacionados com violência urbana e tráfico de drogas, lembre-se de que se a maconha fosse legalizada, tais problemas seriam drasticamente reduzidos. Pense a respeito..... mas com cuidado!
A manutenção da proibição só é boa para quem continua lucrando com a guerra.